Quanto custa fechar um parque infantil?

Vivi a minha vida toda em Lisboa, adepto e muito utilizador dos serviços públicos e uma pessoa que acredita mais na utilidade do empirismo do que em salas de reuniões e folhas de Excel. Tenho para mim a crença de que a gestão pública é deficiente pela falta de calo quotidiano de quem toma decisões. Chamem-lhe de populista, taxista, o que quiserem. Os transportes públicos são o exemplo fácil. A ausência de soluções para serem mesmo um serviço público (seja regularidade, horários, conexões, condições ou mesmo a lógica simples de prestação de um serviço) deriva da preferência da maioria pelo veículo privado (associada à ideia liberal de que só o pobre usa transportes públicos, um princípio péssimo): e não vale a pena entrar no jogo mental de que foi a falta de oferta que gerou esta procura.

Com filhos, essa sensação de que a gestão do espaço e aparelhos públicos é péssima adensou-se pela falta de parques infantis, piscinas públicas e, no geral, falta de coisas para fazer ao ar livre (e não só, mas isso é outra conversa) – em condições – numa cidade com bom tempo, espaço e um potencial enorme. Há parques bons e bem mantidos, claro que há, mas no geral a oferta é parca e medíocre. A generalidade dos parques são pequenos, com falta de aparelhos (e, por vezes, os que há têm falta de manutenção), sem casas de banho, bebedouros ou até um quiosque onde se possa estar, facilitar o encontro entre pais e tornar o lazer mais agradável e não algo que envolve pensar em mil coisas diferentes antes de sair de casa para lá das mil coisas que já se têm de pensar. Eu improviso, os meus amigos improvisam, os pais dos filhos amigos dos meus filhos improvisam, mas é muito comum a conversa resvalar para como em Lisboa a oferta de parques infantis é péssima. Também é nesta altura que nos lembramos de que Lisboa é uma capital europeia. Falta essa capital europeia na prática, Lisboa pode ser muito mais do que comunicação de mupi.

Há parques bons – e limpos – com quiosques. Geralmente nas freguesias mais abastadas (pode-se discutir o porquê, mas não cabe aqui). Mas a generalidade é má. Há parques tão pequenos, mas tão pequenos, que até nos levam a questionar o porquê de existirem. Mas depois lembramo-nos da realidade da oferta e até ficamos gratos por aqueles 25 metros quadrados existirem. Beggars can’t be choosers.

Acredito piamente de que a falta de oferta destas estruturas se deve a falta de utilização destes espaços por quem manda, decide. Não só quem realmente tem o poder, mas também quem está perto dele. Não é o papão do governo, do chefe, mas de todos que entram e saem dos gabinetes. Seja porque não precisa – o gostinho das segundas casas em Portugal – ou porque os tempos livres com os miúdos são despejados para casa dos avós (por n razões, sem julgamento).

O que me leva a escrever isto hoje tem a ver exactamente com esta falta de utilização por quem decide. Domingo passado fui ao parque infantil do Parque Eduardo Sétimo. Não é perto da nossa casa, mas temos um autocarro que nos leva do ponto A ao B sem grande esforço. Nesta lógica de mobilidade, sem viatura privada, este parque infantil é talvez o que melhor nos serve, seja porque está limpo (por exemplo, não tem ratazanas mortas que ficam a decompor durante duas semanas à entrada do parque infantil, como no Campos Mártires da Pátria), por ter uma dimensão acima da média ou por estar localizado numa zona muito verde e com opções caso nos fartemos do parque (há umas quantas árvores porreiras para trepar em diferentes zonas do parque). E também há a Estufa Fria, que foi onde acabámos por ir no Domingo porque o parque estava fechado.

Chegámos às 10:30, saímos da zona por volta das 14. Durante esse tempo todo, o parque infantil esteve fechado porque estavam a decorrer umas filmagens dentro do parque infantil. Num domingo, de manhã. Vimos muitas crianças impossibilitadas de brincar, vimos muitas crianças a chorar (e digo isto sem vontade de puxar o drama da coisa) e vimos muitos pais impossibilitados de brincar com os seus filhos, muitos, talvez, o único tempo na semana que têm para realmente brincar com os filhos.

O parque infantil do Parque Eduardo VII é daqueles parques em Lisboa que vejo sempre cheio de vida ao fim de semana. E, também, daqueles onde vejo pais (de pai) com os filhos, casais juntos a brincarem com os filhos (e não só um, geralmente a mãe, como em muitos outros parques) e uma agradável ausência de avós (nada contra, mas se ainda não perceberam a ideia, vão lá atrás). Também vejo pais em grupo, a falar, a conviver, porque é um parque com um quiosque, casa-de-banho, bebedouros e sombra. Não é especialmente grande, mas a junção disto tudo é obra em Lisboa, sobretudo numa zona tão central e, em teoria, fácil de chegar. Já fiz aniversários dos meus filhos lá.

Tirar isto aos filhos e aos pais a um domingo de manhã para filmagens é criminoso. Uma absurda falta de bom-senso e um belo exemplo da falta de decisores que façam vida no terreno, vivam a cidade e percebam as faltas, o que falha, porque falha e como podemos melhorar. E como podemos ser felizes na rua, ao ar livre, juntar, criar, ter um domingo em família e com amigos que aproveite as coisas naturais que a cidade tem para oferecer.

Fechar num parque a um domingo para filmagens? Qual é o valor que paga isso e será que esse valor justifica não se ter passado essa decisão para um dia da semana ou, simplesmente, ter cagado no assunto?

A sério, quem decide estas merdas?