A alegria de não saber

Quando o dia-a-dia está altamente condicionado pela informação, antecipação, controlo e uma absurda necessidade de ilusão em que há algum poder nisso tudo, advém alguma alegria no não saber. Decidir não saber qual é o sexo da criança não é um gesto de nostalgia ou coragem, é uma forma de abraçar a facilidade de tomar decisões exactamente pela ideia da ausência de controlo.

Enquanto pais, cedo percebemos que o melhor que poderíamos fazer seria não tornar isto de ser pai/mãe uma coisa sobre nós. Um filho não é um atrelado ou um objecto de decoração, uma extensão da nossa personalidade – ser -, uma projeção dos nossos medos ou, pior, um desejo de molde, o quão esculpimos para antecipar qualquer erro que tenha decorrido na nossa vida. Um filho não é nada disso. É uma pessoa e, com isso, vem uma personalidade.

Muito do que está acima não tem nada a ver com o não saber o sexo da criança. Mas ajuda. O não saber não é um exercício de vaidade ou – mais um vez – um exercício de nostalgia. Aliás, não é um exercício. Também não tem a ver com a escolha de cores para o que quer que seja, e também não tem a ver com a obsessão pela escolha de cores neutras para tornar toda uma existência mais neutra. Tem a ver com encarar o bebé como uma pessoa. Mais do que um rapaz ou rapariga.

Noutro nível, ajuda a tomar a decisões. Porque o não saber é libertador, por não existir um conceito limitador daquilo que se pode fazer e, também, por não afunilar as nossas obsessões ainda antes do bebé nascer. Não se compra tudo a dobrar, mas também não se retarda decisões. E, por experiência, bloqueia as ofertas – especialmente vindas da família – de coisas desnecessárias, repetidas ou excessivas. E, por consequência, após o nascimento, facilita dizer às pessoas um não sobre qualquer intenção de compra: de alguma forma, o não saber, nesta sociedade, nos torna menos vulneráveis. E, com isso, ganha-se músculo.

E, ao segundo filho, aprende-se com alguns erros do primeiro. Por exemplo, não revelar quaisquer hipóteses de nomes durante todo processo. Não por causa das opiniões, mas porque se ficarem no conforto do casal é ainda mais fácil assimilarem a ideia de uma pessoa e gerir quaisquer expectativas que possam existir. Ou, como fiz desta vez, comprar duas garrafas de whisky para celebrar ao invés de uma, cada uma a começar com a letra de um dos nomes possíveis. Não que faça muita diferença, é só uma desculpa para comprar duas. É sempre bom ter algum reforço para o que aí vem.